Os anos, para mim, vêm se sucedendo sempre acontecendo coisas piores que os anos anteriores.
Por isso não faço mais planos.
Em 2007 eu continuava com as dores, diárias e intermitentes. Eu não sei se isso acontece para todos aqueles que sofrem de dores crônicas, mas eu acordo com dor e vou dormir com dor.
Isso acaba minando nossas emoções. Eu sempre resisti, bravamente, à depressão. Mas não tem jeito, uma hora ela te pega. Eu sempre fui uma pessoa bem humorada, brincalhona, mas a dor me torna chata, brava, com um humor de cão. Quando sinto dor eu prefiro me isolar. Me isolo dos filhos, do marido, dos amigos...Prefiro não ver nem falar com ninguém.
Fiz umas sessões de psicologia para desabafar mesmo, mas eu sei a origem da minha dor, eu sei o que sinto, sei quanto sofro, mas as vezes me sinto egoísta, pq não posso obrigar as pessoas que estão ao meu redor que sintam as mesmas coisas que eu sinto. Já as vezes não me sinto assim, fico com raiva. Raiva, principalmente da impotência. Acho que esse é o pior sentimento.
Impotência. Eu tenho tantos planos e não posso levar adiante, eu tenho tantos sonhos e eles estão em compasso de espera...
Quando ingressei na faculdade de Direito, eu já tinha 35 anos, é tarde eu sei. O que eu queria era fazer a faculdade e ir para escola de magistratura. Pensei, como juíza, eu poderia ajudar as pessoas a solucionar mais problemas, a tornar o mundo mais justo. Esse ideário de justiça ainda não acabou, o sonho persiste...se ele vai se concretizar ou não, isso não tenho mais certeza!
Entrar com 35 na faculdade é tarde. Mas se for analisar que eu me casei cedo, tive minha primeira filha cedo, aos 19 anos então as coisas começam a ter sentido.
Esperei minha filha ir para a escola, depois do pré, para voltar a estudar. Ok, ingressei em contabilidade na UFPR e tudo estava indo bem. No primeiro ano de curso eu já estava grávida. Então em 94 nasceu minha segunda filha. Era fevereiro, as aulas voltaram em março então tudo bem. Correria, muita correria. Cuidar de dois filhos e estudar não é fácil. Então engravidei de novo!!!! Engravidei amamentando, e lá fui eu de novo, grávida para a universidade. Pensei, vou dar um jeito. Esperei tanto tempo né? Em 95 nasceu minha terceira filha...Então passei anos sem estudar até ingressar em Direito em 2002.
E não é que fiquei grávida de novo? Se não fosse pelas dores eu teria continuado sem cessar os estudos, mas tranquei e retornei, mesmo dolorida.
Explico, quando tive minha primeira filha tive uma endometriose. A endometriose pode causar infertilidade. Então passei muito tempo fazendo tratamento contra infertilidade, esse funcionou...rs, que diga o meu bando de filhotinhos em casa. Então da minha segunda filha a terceira veio de embalo.
A faculdade não me deu nenhum apoio material, mesmo no chamado "tratamento especial" eu me matei de estudar pra passar. Ah, finalmente, eu consegui uma cadeira especial. Cadeira de faculdade é a pior coisa que existe, são duras e desconfortáveis. Minha orientadora falou com o responsável pelo Setor e me conseguiu uma cadeira estofada, na minha altura...Isso me permitiu ir as aulas.
De cirurgia em cirurgia, de tratamento especial em tratamento especial eu consegui terminar a faculdade de Direito.
Tive que pedir prazo especial para defender a Banca de Monografia, mas valeu a pena. Minha monografia foi escolhida para participar do concurso de monografias, de três escolhida pela faculdade. Ser escolhida de 3 entre 680 que se formam todos os anos é uma vitória
.
Estudar é algo que me faz extrema falta. Ficar em casa é entediante. Eu gostaria sinceramente de sair me inscrevendo nos concursos que aparecem. Mas aí penso: Se eu passar na prova como fica? Eu entraria para o serviço público? Eu passaria em um exame médico (com os peritos médicos não do INSS, óbvio, mas aqueles que fazem a seleção dos candidatos aptos e não aptos para o GOVERNO FEDERAL). Claro que não!!! O INSS pode até me considerar apta para o serviço privado, mas jamais me consideraria apta para o serviço público. Mesmo pq a aposentadoria por invalidez por doenças graves é de 100%, e, 100% do regime especial de previdência (não limitado ao teto de R$ 3.038,99 atuais).
Eu tenho até vontade de fazer, pra ver como é que fica...Será que eu aguentaria trabalhar durante o estágio probatório de 3 anos? A partir daí eu seria estável, e portanto, não poderia perder o cargo, exceto por processo administrativo, sendo me dado o direito de ampla defesa e do contraditório.
Eu me percebo cada vez mais, mais emotiva, mais instável emocionalmente, acho que estou a um passo de um colapso nervoso.
Tenho síndrome de abstinência quando o nível de morfina baixa, tenho calafrios, sofro frio quando está o maior calorão lá fora, vivo carregando uma manta para todos os lugares da casa.
Me sinto inútil, me sinto cansada. Sem energia. Acordo parecendo que dormi dentro de uma caixa, toda quebrada...
Programei de levar meu filho mais novo para assistir "Madagascar 2" nas férias. As férias estão acabando e não consegui um único dia, em que eu estivesse pelo menos "mais ou menos bem" para levar meu filho. Ele me cobra, eu adio. Por fim não vou mais...
Como renunciar aos pequenos prazeres da vida? Se antes eu tinha energia para escalar o pico do morumbi, na Serra do Mar, lindo, hj eu penso duas vezes antes de ir a caixa do correio...se antes eu trabalhava 12/14 horas por dia, hj eu escrevo com pausas, escrevo um pouquinho, fico de pé, ando, deito um pouquinho, dai retorno para a postagem...eu dependo de ajuda pra pegar algo que caiu no chão, pq eu não consigo dobrar a coluna suficiente para me abaixar (correto) apoiada nos joelhos vou depender de alguém para me ajudar a levantar...
Eu não tenho pena de mim não, também detesto a posição de vítima, não é esse o meu papel na vida. Sempre fui uma lutadora, uma militante política revolucionária, sempre disposta a participar de passeatas, de defender os direitos de todos.
Como se colocar em uma posição de absoluta sujeição? Como ser dependente se sua postura sempre foi de absoluta independência? Como???
Eu decidi que 2009 será meu ano para soluções...Não sei quais, mas elas irão surgir. Seja em uma nova cirurgia *arghhh*, seja em um novo tratamento, seja em um novo médico, seja por equipes multidisciplinares, este ano algo vai ter mudar. E radicalmente. Simplesmente pq eu não quero continuar vivendo do jeito que está...
Abraços a todos!
Clê
7 comentários:
Clê Barroso,
Emocionei-me ao ler seu relato.
O que transbordou em minhas emoções e veio logo ao pensamento, foi a canção do Milton Nascimento, "Maria, Maria"!...
Maria, Maria
Composição: Milton Nascimento e Fernando Brant
Maria, Maria
É um dom, uma certa magia
Uma força que nos alerta
Uma mulher que merece
Viver e amar
Como outra qualquer
Do planeta
Maria, Maria
É o som, é a cor, é o suor
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que rí
Quando deve chorar
E não vive, apenas aguenta
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida....
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria...
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida....
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Hei! Hei! Hei! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!...
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria
Mistura a dor e a alegria...
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho, sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania
De ter fé na vida
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê
Hei! Hei! Hei! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Ah! Hei! Ah! Hei! Ah! Hei!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!
Lá Lá Lá Lerererê Lerererê!...
E assim, dito tudo, desejo-lhe com intensa força tudo de bom para você, seus familiares e amigos.
Força e fé, companheira!...
Coragem "companheira" a força vem de Deus, agarre como puder nas mãos dele e serás vencedora. Um abraço Cida
Tenho perícia dia 02/09 ja estou com medo, dor de barriga e depressão, sei o que passarei novamente. Enfim tenho que ir. Abraços Cida
Gomper, obrigada pelos elogios, também adoro essa música principalmente na voz do Milton, é muito linda.
Cida:
Meu benefício só irá até 31/01, agora, sábado. Tb passo por esses sintomas...O médico lhe afastou até setembro? Puxa que bom, pelo menos é um periodo sem "stress".
Beijosssss!
Clê
Ola, sei muito bem do que fala e sente...Tenho 32 anos e sofro com esta doença desde meus 27 anos, ja passei por 3 cirurgias grandes e ja estou me preparando para 4. Sinto me impotente e sem forças e parece que quem não passa por isso não entende o motivo de tanta dor e sofrimento.Estou passando por momento de angustia, não sei mais o que fazer, mas vamos em frente. Abraços Andressa
Oi Nara, que bom que escreveu.
Eu sei que não trago soluções, pois ainda não as encontrei, mas trago um espaço para a gente se conhecer e saber que existem outras pessoas passando pela mesma situação: dor e abandono.
Um beijo Grande!
Clê
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